O relatório
Cenário e enquadramento: o gabinete do director.
Director – O senhor professor não
entregou o relatório da actividade (pausa,
olha para o monitor do computador, procura o texto com o rato): colóquio
subordinado ao tema, “A espiga, estudos para uma semiótica do milho transgénico
e as suas consequências para a música «a desfolhada», de Simone de Oliveira”.
Professor – Peço imensa desculpa, é que
tenho tido imenso trabalho. Depois desse colóquio, já organizei um workshop, um ateliê de pintura ao vivo e
um vernissage literário.
Director – Pois, mas é que sem
relatórios… não há actividades…
Professor – Mas há… Houve… actividades!
Director – Houve?
Professor – Mas como? O senhor director
esteve lá… Esteve no colóquio, no workshop, no ateliê…
Director – Estive? Onde é que isso
está escrito? Se ao menos tivesse o relatório…
Professor – (Indignado) Mas o que é mais
importante? As actividades ou os relatórios? Já não percebo nada!
Director – Enquanto o senhor Professor
não fizer um relatório não poderá saber o que é mais importante… Se é a
actividade, se é o relatório da actividade… Experimente fazer um, vai ver que
não quer outra coisa…
Professor – Mas…
Director – Aqui entre nós: só hoje já
fiz três… (pausa. Assume uma postura
rígida e um olhar vidrado) E pedi que me entregassem dez! (em arrebatamento)
Professor – Mas relatórios de quê?
Director – De actividades! (Vidrado!)
Professor – Mas quais actividades?
Director – As que estão nos
relatórios! (Babando!)
Professor – Mas isso são actividades
“fantasma”!
(Momento nonsense do Sketch: entra no gabinete um fantasma. O fantasma faz: “Huuuu”. A réplica habitual
dos fantasmas, a saber, uma pessoa debaixo de um lençol branco com duas aberturas
no lugar dos olhos. O professor, de costas para a porta, volta-se para trás e
diz:)
– Voilá!
(Pausa, momento em que se espera que a plateia ria, aturdida. Fim das gargalhadas… Não, afinal ainda há uma senhora que ri histericamente. Ok, agora sim, já parou! Há um membro da equipa de produção do programa, que está incumbido de permanecer entre o público convidado durante a gravação dos sketches, e cuja função é abater à paulada na corneta os espectadores menos contidos. Aí vai a senhora, em braços, para a enfermaria…)
(Pausa, momento em que se espera que a plateia ria, aturdida. Fim das gargalhadas… Não, afinal ainda há uma senhora que ri histericamente. Ok, agora sim, já parou! Há um membro da equipa de produção do programa, que está incumbido de permanecer entre o público convidado durante a gravação dos sketches, e cuja função é abater à paulada na corneta os espectadores menos contidos. Aí vai a senhora, em braços, para a enfermaria…)
Director – (Levanta-se e dirige-se ameaçadoramente para o fantasma, que abre
gabinete afora. Recompondo-se, sentando-se,
retomando o fôlego) Para seu governo, ainda ontem acabei um relatório sobre
a sua última aula assistida!
Professor – Mas qual aula assistida?! O
Senhor director ainda não assistiu a nenhuma aula minha… Sempre que tento
agendar, o senhor director está ocupado…
Director – A fazer relatórios! A
fazer relatórios! (Pausa. Parece refectir) A trabalhar! A trabalhar!
Professor – Mas… posso ver esse bendito
o relatório? … (Recebe o documento,
empertiga-se) Mas aqui diz que eu faltei à minha aula assistida…
Director – Pois foi… É gravíssimo!
Está aí tudo! Esteve lá? Não esteve! (Regista
apontamentos num bloco de notas)
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