Comecei a escrever no duche

Sátira aos aspirantes a tudo e mais alguma coisa que pululam, nomeadamente, no panorama televisivo actual

Como é que eu comecei a escrever? Comecei a escrever no duche ainda muito novo. Tinha vergonha de escrever à frente das outras pessoas... Tinha medo que achassem que eu escrevia mal... Até que um dia a minha mãe entrou de repente na casa de banho e apanhou-me a masturbar... Lembro-me das palavras dela como se fosse hoje.... Ela virou-se para mim e disse: que susto, filho, pensei que andasses a escrever às escondidas ou assim! E saiu para me deixar à vontade. Fiquei de rastos e durante algum tempo não escrevi... Tinha medo de ser apanhado... Um dia ganhei coragem e disse-lhe no que andava mesmo metido, que o meu sonho era aquele e que queria segui-lo até ao fim do mundo. Ela disse-me que compreendia, que eu estava a crescer, que aquilo de escrever eram coisas próprias da adolescência, que havia de me passar e rematou com estas palavras que agora reproduzo, não sem alguma emoção: agora vai lá para o quarto e masturba-te um bocadinho que essa história de escrever vai acabar por passar. Mas não passou! Comecei a escrever na sala, à frente de toda a gente, no jardim, no hall de entrada quando recebíamos visitas, só para envergonhar os meus pais. Uma vez, a minha mãe convidou um casal amigo para ir lá a casa e mandou-me pôr a mesa. Nos guardanapos deles escrevi: kero sere echecritôre i us meos paixe nãu deichão. Assinado Kamões, que era assim que eu assinava os meus textos. A partir daí começou a espalhar-se que eu escrevia e começaram a convidar-me para escrever em restaurantes chiques, enquanto as pessoas jantavam. Depois comecei a fazer o circuito dos bares e nunca mais parei até hoje. A que é que atribuo o meu sucesso? À minha perseverança, a nunca desistir daquilo em que acreditava, a não fazer cedências ao facilitismo e a manter os níveis de exigência e de qualidade sempre lá em cima... O que é que eu aconselho às pessoas que querem fazer da escrita a sua vida? O meu conselho é que parem de se masturbar e sigam o seu coração, persigam o seu sonho. Se o sonho é escrever, invistam num bom processador de texto, num bom corrector ortográfico e vão em frente. Eu falo por mim, comecei a perseguir o meu sonho por todo o lado até que ele teve de ceder e tornar-se realidade... Quem não arrisca, não petisca! O que é que eu senti quando enchi os coliseus de Lisboa e Porto na mesma semana? Foi uma sensação única, nunca tinha escrito para tanta gente e foi um momento único na minha carreira que vou guardar para sempre. O que é que me apetece escrever neste momento para vocês? Eh pá, não vinha preparado para isto. Ok, ok, eu escrevo: é seichta feirã e xobe comó carassas! Está escrevido!

Nota: durante o sketch, podem aparecer imagens do escritor a escrever no restaurante, recriando o espaço onde habitualmente existe um piano, com um jogo de luzes como se se tratasse de uma actuação musical... O mesmo nos bares... Depois, em teatros, salas de espectáculo, festivais de verão, etc...

Nota 2: o Sketch pode ser feito em modo entrevista.

Nota 3: pode ser feito em stand-up.

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