Nem o pai morre...

Aquilo que eu aprecio mais nas pessoas que já atingiram uma certa idade... Ok, admito, estou a falar do Mário Soares. Andava a protelar isto a ver se a gente almoçava, mas o que é certo é que nada acontece e, assim, não me restam grandes alternativas. Lá terei de falar no homem, apesar de ter prometido ao meu pai que jamais o faria. Agora que penso nisso, o meu pai deve ter pressentido que iria morrer primeiro que ele, o que o deve ter aborrecido muito. A esta distância, friamente, também não era algo difícil de prever: um foi enviado à força para Angola, na década de setenta; o outro, para aquele país africano, como é que se chama?, ai!, França, isso. Como estava a dizer, o que eu aprecio mais nas pessoas que já atingiram uma certa idade é que já não lhes resta muito tempo. Enfim, no caso do Mário Soares não se verifica e eu só encontro uma explicação para que isto aconteça: ele está a embirrar comigo! Estou convencido que um dia que morra vai ser daquelas "pessoas que não morrem: andam por aí", como morria numa das suas últimas crónicas na Visão, António Lobo Antunes, acrescentando que estas pessoas que não morrem no-lo fazem questão de dizer: "segredam-nos", morre ainda Lobo Antunes, "- Não faleci, sabes? E não faleceram [...] Quando é necessário, poisam-nos a palma no ombro." E Lobo Antunes sabe do que fala, morre de quinze em quinze dias na Visão e não há medium que perscrute aquilo. Uma das coisas que mais me aborrece no Mário Soares é que é o pai da democracia portuguesa, o que significa que enquanto for vivo a democracia tem de fazer o que ele quer, ou como se diz noutro português, respeitar a sua vontade. É dever dos filhos respeitar os pais, a democracia portuguesa é ainda uma jovem, ainda a precisar de um acompanhamento parental muito próximo. Deve ser por isso, que ele tem tanta tendência para a paternalizar, sobretudo, num desdobramento invulgar de entrevistas, crónicas, reportagens, documentários, Prós e Contras e debates. No momento político actual, a democracia é uma adolescente que adora contrariar o pai e fumar umas ganzas. O Passos Coelho anda a namorá-la e Soares não gosta, fica acordado até tarde a ver a que horas chega a casa e, sobretudo, em que estado chega! Outra coisa que não gosto em Mário Soares é que não tem cicatrizes no corpo (as de nascença não valem!), se calhar tem-as na alma mas eu de poesia percebo pouco. Gostava de ter como símbolo da nação uma espécie de cruzamento entre Ulisses e Aquiles, heróis que montam cavalos e acham que cavalgar tartarugas, mesmo que gigantes, é como, no parque de diversões, preferir o carrossel à montanha russa. Enfim, agora já me sinto mais aliviado. Também estive a fazer cocó durante o tempo em que escrevi a crónica, o que, apesar de discreto e não dar nas vistas, ajuda bastante em questões de aliviar. Enfim, desculpem-me o desabafo, sei que vocês têm mais em que pensar. Eu agora vou aproveitar e ficar aqui sentadinho a tentar expulsar do esófago - já peguei no piaçaba - o elenco inteiro de "Nem o pai morre nem a gente almoça". O Júlio César é que vai ser mais difícil, porque traz agarrado às canelas pares de bailarinas nuas, que vão com ele para todo o lado. E a seguir vou passar queimax nas coxas que o computador aqueceu muito e eu depilei-me sem querer. Enfim, vou aproveitar e tratar da higiene. Façam o mesmo!

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